sábado, 1 de junho de 2013

Gordofobia

Gordofobia

Sou de uma espécie pitoresca de palhaço
Que a sociedade elegeu ao picadeiro.
Muito pouco do que falo, ou do que faço
É recebido com respeito verdadeiro.

Das pessoas é costume o escárnio,
Já que a minha silhueta vem primeiro.
Minha dieta é motivo de debates
E dela qualquer apedeuta é conselheiro.

De pareceres desportivos estou farto.
Boas senhoras, assaz, me falam o que é certeiro...
Levante os braços! Estufe o peito! Dê uns passos!
Serás em breve belo, lépido e fagueiro!

Não sei bem quando me tornei pessoa pública.
Nunca quis, eu, ser motivo de conselho.
Mas, não há gesto defensivo que derrube
O preconceito com disfarce prazenteiro.

E os sabores que a vida nos fornece
No meu caso são uma faca de dois gumes.
Se, por um lado, me agradam os sentidos,
De outra feita, devem me encher de culpa.

São, portanto, meus direitos limitados
Pela turba que me vê como percalço.
Mal sabem eles como é duro meu pedaço.
Sentir-me errado, mesmo que me saiba inteiro.

O que é fácil para quem não se avoluma
Para o meu turno é uma vida de penúria.
Eu me restrinjo dia a dia, passo a passo.
Quem sabe alcanço o que exige-me o terceiro.

Contudo a neve, um dia, reaverá o espaço.
E os esbeltos tremerão qual bambuzeiro.
E eu vou rir como um demônio redimido
A morte fria de quem me foi traiçoeiro.