A pequenina
Por Russo Esperançoso
À memória de Paulo Vanzolini
O olhar que, brilhante, me olhava
Mostrava-se isento de qualquer preconceito.
Pleno de curiosidade era feito.
E da fé no ser humano me lembrava.
Aquela pequenina que eu via,
Às voltas com suas dobrinhas e fraldas,
Era intrépida na caminhada
Que ainda há pouco aprendia.
Alguém lhe pôs chiquinhas,
Que pareciam incomodá-la,
Pois, balançava a cabeça para livrá-las,
Soltando as mechas encaracoladas.
E as bochechas, cor de chocolate,
Abriam-se com um largo sorriso,
Tentando, a mãe, convencer com isso,
Que, à frente e altiva, a advertia,
Levando, à mão, as sandálias da filha.
Não podia desfazer mais o traje,
Que, chique e comportada, a definia,
Embora, também, pouco somasse
Ao nobre encanto que já possuía.
Sorri e acenei, como os adultos fazem,
Para serem, ao seu modo, gentis aos pequenos,
Mas, de semblante sério, respondeu mais ou menos,
Com a cordial desconfiança que os pais nos ensinam.
Bem ao descuido, porém, das crianças,
Fitando-me com o fascínio pelo que é diferente,
Descuidou de um tufo de grama à sua frente,
Tombando num lance de levantar as tranças.
Instaurou-se o suspense, pelo bem da menina,
Na mãe e em todas as mulheres do entorno,
Aguardando, atônitas, o segundo de inércia
Que vem antes da dor e do correspondente choro.
Esbocei, com minha esposa, um pronto socorro,
Do que me isentou o pai, homem grave e imenso,
De quem eu já aguardava um merecido impropério,
Por ter distraído a criança, no seu denodado progresso.
Mas, sorriu e fez um gesto para que nós esperássemos,
Voltando o olhar à pequenina, que forçava, com os braços,
O levante do seu todo, sem qualquer estardalhaço,
Como um pai que sabe a força contida naqueles passos.
Para o alívio de todos, apenas bateu os vestidos,
Buscando com o olhar a mãe, que a aprovava, serenada,
E dessa vez me dirigiu um envergonhado sorriso,
Correndo para as pernas do pai, que no colo a acomodava.
Deles, todos nós, ao redor, nos despedimos,
Felizes com o desfecho do momentâneo embaraço,
Que a par da solução austera dada pela própria vítima,
Poderia ter deixado, naquela jóia, amargo traço.
Era sábado e eu lia o jornal na Quinta da Boa Vista,
Havendo, nem mais, nem menos, de tudo que sempre quis,
Com minha mulher ao lado e a paz da cercania,
Eu via na pequenina um bom futuro para o nosso país.
sábado, 31 de janeiro de 2015
A pequenina
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